25 novembro 2011

Reformas na adminstração local.

Deliberação






Considerando que a apresentação da Proposta de Lei do OE para 2012 põe a nu as reais motivações, conteúdos e objectivos que o Documento Verde da Reforma da Administração Local (conhecido como «Livro Verde») dissimula sob um punhado de frases feitas e falsos desideratos ali proclamados;



Considerando que às altissonantes proclamações contidas no «Livro Verde» (de que são exemplo as repetidas referências a “ganhos de escala”, “coesão territorial”, ”sustentabilidade financeira”, “racionalização e eficiência”) se revela exposto contrapõe, em toda a sua exuberância e brutalidade, esta proposta de lei de Orçamento de Estado que, em si mesma, em matéria de autarquias locais, é um exercício de condenação do poder local democrático e um ataque sem precedentes ao municipalismo e à vida democrática no plano local;



Considerando que a Proposta de Lei do Orçamento de Estado para 2012 exibe e impõe um modelo que, para lá da flagrante violação do princípio constitucional da autonomia, exprime uma concepção centralista e de grosseira subalternização do poder local, procurando transformar as autarquias em meras dependências do poder central administradas e reguladas em matérias decisivas (como as financeiras, orçamentais e de pessoal) a partir não das decisões dos eleitos com legitimidade para o fazer, mas sim de actos discricionários de membros do governo;



Considerando que esta concepção (em flagrante contraste e negação da retórica exibida pelo«Livro Verde» sobre “reforço saudável do municipalismo“) significa que decisões como as de abertura de concursos para admissão de pessoal, de fixação da estrutura municipal ou da definição elenco de pessoal dirigente ou de contracção de empréstimos passam a ser determinadas pelo Ministro da Finanças, num quadro conceptual de gestão local que a aproxima perigosamente daquela a que a Revolução de Abril veio pôr cobro;



Considerando que a Proposta de Lei do Orçamento de Estado para 2012 dá um novo passo, agora qualitativamente de outro nível, no processo de asfixia financeira das autarquias (evidenciado pela perda crescente de peso das transferências para as autarquias quando comparadas quer na sua relação com a evolução dos impostos cobrados pelo Estado, quer na sua relação com o Produto Interno Bruto) e que há já largo tempo se vem desenvolvendo ao arrepio do preceito constitucional que determina a justa partilha de recursos públicos entre os níveis central e local do Estado em flagrante violação dos regimes legais de finanças locais (cada um deles construído, no plano dos montantes a afectar às autarquias, sobre os escombros de sucessivos incumprimentos dos que o antecederam);



Considerando que, com esta Proposta de Lei, o Governo não só retira mais 120 milhões euros aos valores transferidos pelo Orçamento de 2012 face ao de 2011 (num processo de subtracção de verbas a que as autarquias tinham direito que ascenderá a uma verba superior a 700 milhões de euros no período de 2010 a 2012 e a cerca de 1.200 milhões de euros até 2013 se não for interrompida a aplicação do Pacto de Agressão que está a ser imposto ao país) como lança mão de novos e intoleráveis expedientes para cobrir novos roubos ao poder local;



Considerando que é inaceitável num estado de direito e democrático, que o Governo decida, tenha em vista não só reduzir, arbitrária e discricionariamente, reduzir para metade os limites estabelecidos em Lei para efeitos de endividamento (de 125 para 62.5% do montante das receitas provenientes dos impostos municipais, da participação dos municípios no FEF, da derrama e da participação nos resultados das entidades do sector empresarial local, relativas a o ano anterior) e colocando, de um momento para o outro, mais de 180 municípios numa situação de “incumprimento” sem que tenham alterado nenhum elemento material relevante;



Mais considerando que, defraudando os mais elementares princípios da boa fé, o mesmo Governo, suportado nesse golpe, pretende justificar uma retenção de verbas que ascenderá a mais de 150 milhões de euros;



Considerando a intenção de roubar aos trabalhadores da administração local (a exemplo do sucederá nos outros níveis da administração pública e à generalidade dos pensionistas) as remunerações correspondentes aos subsídios de férias e de Natal que, a par da prorrogação das reduções salariais que vigoraram este ano e dos novos cortes nos pagamentos devidos pela prestação de trabalho extraordinário, constituirá um golpe nos rendimentos familiares com consequências não apenas nas condições de vida e dignidade de milhares de famílias como um factor de retracção na vida económica local e nas possibilidades de sobrevivência de pequenos empresários;



Considerando que com a drástica redução de verbas transferidas para as autarquias fica não apenas comprometida a capacidade de investimento e de resposta necessária às funções de serviço público, mas também a possibilidade de apoio e estímulo à actividade das colectividades e do movimento associativo em geral que hoje têm como único parceiro o poder local para a múltipla e insubstituível acção de promoção do desporto, da cultura e do recreio que desenvolvem;



Considerando que adicionalmente e para lá das retenções ilegais que a citada Proposta de Lei consagra e dos pagamentos coercivos impostos a pretexto de ressarcir o Serviço Nacional de Saúde, ela determina ainda um conjunto de disposições sobre dívidas a fornecedores e a “encargos assumidos e não pagos” que, em rigor, podem significar a absoluta impossibilidade de gestão financeira e orçamental de um número significativo de autarquias;



Considerando que a chamada “reorganização administrativa” destinada à liquidação (pomposamente disfarçada no Livro Verde sob a designação de “agregação”) de quase duas mil freguesias constitui em si mesmo um deliberado factor de empobrecimento da dimensão democrática e participada do poder local e do valor que representa a alargada intervenção de cidadãos na gestão da vida pública local (uma redução de quase 20 mil eleitos da intervenção cívica e política) e um visível reflexo das concepções antidemocráticas instaladas no Governo;



Considerando ainda que esta “reorganização” não é determinada por nenhuma intenção séria de dignificar e elevar a eficácia da gestão das autarquias (o que pressuporia, como linha condutora essencial, o fortalecimento das condições, meios e instrumentos postos à disposição do poder local e não a sua sonegação) ou de “modernizar” a administração do território (que exigiria, para ser levada a sério, não um processo cego de liquidação de centenas de autarquias mas sim a concretização do processo de regionalização);



Considerando que com esta reforma o que se pretende é menorizar o poder local e a expressão democrática de representação e participação política (e não a cínica invocação de “melhoria da eficácia”), atingindo pela extinção coerciva as freguesias e por um maquiavélico processo de asfixia e inviabilidade financeira (que o Orçamento de Estado testemunha) a liquidação de dezenas de municípios;



Considerando, por fim, que se pretende ainda impor a subversão do sistema de eleição dos órgãos municipais para assegurar a constituição de executivos monocolores à custa da liquidação do seu carácter plural e democrático e das condições de fiscalização e controlo democráticos, num quadro em que, no fundamental, o actual regime provou ser não apenas um factor de governabilidade e estabilidade, mas também um espaço de cooperação e trabalho comum de eleitos de diversas forças políticas.





...................... delibera:



1. Rejeitar o chamado «Livro Verde» para a reforma da administração local por este se constituir como um instrumento orientado para a liquidação do poder local democrático e das suas características mais progressistas;



2. Manifestar a sua mais viva oposição a uma proposta de Lei de Orçamento de Estado que se afirma, nas suas disposições, como um meio de impor limitações inaceitáveis à autonomia das autarquias e de consagrar cortes de financiamento incompatíveis com o pleno direito de exercício das suas atribuições e competências;



3. Rejeitar a campanha de condicionamento da opinião pública para a menorização do poder local e de fomento da desconfiança sobre os eleitos, destinada a justificar um ataque que em ultima instância, é dirigido contra as populações e se destina a iludir o contributo insubstituível que as autarquias deram para a melhoria das condições de vida e o progresso local traduzido numa obra que, não isenta de insuficiências, está à vista e comprova o seu papel como o factor principal de investimento local e de rentabilização das verbas postos à sua disposição;



4. Alertar as populações, o movimento associativo local, os trabalhadores das autarquias e os agentes económicos locais para as consequências nas condições de vida e nos condicionamentos ao desenvolvimento e progresso locais que daqui resultarão;



5. Sublinhar que este ataque ao poder local é um ataque dirigido às populações, aos seus direitos e legítimas aspirações a uma vida digna, é inseparável da ofensiva que ao mesmo tempo extingue serviços públicos, nega o direito à saúde, reduz o direito à mobilidade, tudo num processo de desertificação e abandono que a liquidação das freguesias só acentuará;



6. Manifestar a inteira solidariedade aos trabalhadores das autarquias atingidos nos seus rendimentos, direitos e estabilidade de emprego quer pelas disposições do Orçamento de Estado relativas a matéria salarial ou de carreira, quer pela ameaça decorrente da extinção de centenas de freguesias ;



7. Apelar à mobilização, ao protesto e à manifestação dos legítimos sentimento de indignação por parte da população e dos trabalhadores contra estas medidas e estes objectivos, sublinhando que essa luta é parte integrante do direito e do dever dos portugueses de exigirem a rejeição do Pacto de Agressão que, imposto pelo estrangeiro e subscrito pelos promotores da política de direita, ameaça e compromete o futuro dos portugueses e do país.